16.9.09

Alma lavada (6) – reforma íntima

Durante muito, muito tempo, a terapia era ficar deitada, às vezes por horas, com a venda nos olhos, sem fazer nada. Nos pediam inclusive pra não conversar nos quartos. Pra certas pessoas, como eu, foi um tratamento de choque.
Quase todo o tempo se ouvia música instrumental nas caixas de som por todo o prédio e, ocasionalmente, colocavam a leitura de alguma mensagem, mas nunca com termos como espiritismo, reencarnação ou coisa parecida. Inclusive disseram no começo, que se alguém tivesse um santinho ou símbolo de qualquer religião, que quisesse deixar no quarto, não havia nenhum problema.
A única coisa atrelada à religião era a oração do Pai Nosso. Foram centenas de vezes. A cada início e final de terapia, a cada passe aplicado, o Pai Nosso era rezado.
As conversas e terapias iam se aprofundando a cada dia, e as amizades entre os pacientes, ganhando força. Só o fato de estar entre tantos portadores de câncer já fazia eu me sentir uma grande privilegiada. Me dar conta de que o mundo continuou seu curso mesmo comigo “isolada” por uns dias também foi um aprendizado.
Comer o que me era oferecido (aliás, deliciosas refeições), na hora em que era oferecido, obedecer a regras, manter o silêncio, abandonar roupa, maquiagem, ouvir as histórias dos outros, reconhecer que estava ali pedindo ajuda, tudo isso foi ajudando na preparação para o que ainda viria.

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